Nosso momento: necessário escuta afinada

Aproveitando esta ‘quarentena’ procurei os meus ‘alfarrábios’, para fazer uma releitura, como ‘profecia retroativa’. Gostaria de pontuar alguns tópicos destas anotações, que foram feitas do final de 2016 até outubro de 2019. Já se anunciava, então, que alguma coisa poderia não dar certo:

Vivemos um momento de mundo mais ou menos assim: a correria nos causa cansaço crônico. O fim do dia, traz o vazio; a economia é de exclusão e de idolatria do dinheiro; a bolsa de valores se reveza entre ocidente e oriente; a globalização da indiferença; a crise ética; os gemidos da terra se confundem com  os gemidos dos abandonados.

Tais sinais exigem de nós: humildade, acolhimento, criatividade, diálogo interpessoal.

Agora vivemos um momento em que é preciso “equalizar o nosso som”, apurar o ouvido. Procuramos sintonia fina. Sem isso, não entenderemos nada. ‘A lição, sabemos de cor; só nos falta aprender’.

Momento histórico, em que somos todos aprendizes. Grande desafio.

O que precisamos aprender?

Não controlamos mais nada. Para os nossos questionamentos, não esperamos respostas bem elaboradas para anotá-las com o lápis e papel que temos na mão. As perguntas vêm de região que teimávamos desconhecer: de onde viemos? Onde estamos? Para onde vamos? Qual é o sentido de nossas vidas?

Foi necessário aparecer um vírus frágil, pequeno, ínfimo e imperceptível, que grita silenciosamente aos nossos ouvidos:

Por que vocês fazem do dinheiro “o seu deus”? Deixem que a economia seja somente do mercado. A sociedade humana deve ser da Justiça, da Verdade,  da Transparência e da Lealdade.

Por que vocês fazem do lucro, do luxo, do poder, do sucesso e da fama o sentido de suas vidas?

Será que vocês sabem o que é o essencial e onde o podem encontrar?

Este serzinho insignificante, está nos dizendo, paradoxalmente, que todas as pessoas são importantes e que nós não temos cuidado bem delas, principalmente das mais vulneráveis.

Automóveis, ônibus e aviões, parados e perdidos, sem saber para onde vão. O empresário, com o respirador ligado, ainda pergunta pelo índice da Bovespa.

O planeta mais bonito do Universo nos pediu uma pausa, mas nós não o escutamos.

A globalização nos expulsou para fora de nós mesmos. As pessoas nos procuram, mas não nos encontram. Encontram sim, funcionários, burocratas, legalistas, tarefeiros. Todos agitados, procurando fazer muitas coisas, porque não sabem ficar em silêncio consigo mesmos…

Saímos de nossas casas, porque somos ‘homens sérios, não temos tempo a perder’ e terceirizamos o cuidado de nossa família que, por isso, tornou-se instituição fragilizada. O Universo nos pedia uma pausa, mas nós não o escutamos.

Algo está acontecendo que me traz um misto de tristeza e alegria: a natureza, nesta quarentena, se sente ‘aliviada’. O barulho ensurdecedor que ecoa nas profundezas da terra diminuiu sensivelmente.

Qualquer pequeno aglomerado urbano do nosso país está profundamente interligado com o mundo.

Nas famílias, vivemos debaixo do mesmo teto as nossas várias solidões… Fizeram-nos acreditar que a tecnologia era tudo, mas se esqueceram de um detalhe simples: as pessoas. Pessoas não foram criadas para salvar coisas, coisas não foram criadas para salvar pessoas; mas pessoas foram criadas para salvar pessoas.

Não poderia dar certo!

+ Aloísio Vitral

Bispo de Sete Lagoas

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